Camacho é o treinador do Benfica, e é o treinador espanhol que os adeptos agora têm de apoiar! Mas a saída de Fernando Santos custou-me mais a mim, como adepto, do que a saída de Simão Sabrosa. Não porque pense que a longo prazo Fernando Santos era o melhor treinador para o Benfica, mas porque esta decisão após uma jornada do campeonato, e a meio da pré-eliminatória da Liga dos Campeões, foi em tudo precipitada e perigosa. Felizmente o Benfica ganhou fora contra o København, mas teve a sorte do jogo, e apenas por milagre não sofreu nos primeiros minutos pelo menos um golo. Mas custou-me principalmente porque tenho de admitir como adepto, que a gestão desportiva do Benfica é ainda muito amadora. Não faz qualquer sentido um treinador que não tem o apoio dos adeptos, e imaginava-se que teria o do Presidente e da estrutura, planear a temporada e inclusive as contratações, ser demitido da forma como foi.
Fernando Santos não era um nome consensual aquando da sua vinda para o Benfica no final da época passada. Não era pelo menos o meu favorito. Falaram na hipótese Erickson, que em relação ao Fernando Santos, tinha um nome mais mediatizado, e que já tinha treinado o Benfica com enorme sucesso. Sou um admirador do football das equipas de Erickson, ou da sua filosofia de jogo, e portanto confesso ter ficado um pouco desiludido quando Luís Filipe Vieira se decidiu por Fernando Santos. Mas vistas bem as coisas Fernando Santos já tinha experiência de treinar “grandes” em Portugal, é um confesso Benfiquista, e é um homem sério e na minha opinião competente e culto.
O grande problema de Fernando Santos no Benfica foi não ter conseguido captar a empatia dos adeptos. Chego à conclusão que no Benfica para se ser bem sucedido como treinador, mais do que se ser competente nas questões de treino, tem de se ser mediático e popular entre os adeptos. Muito dificilmente no Benfica algum treinador terá sucesso sem o apoio directo da massa associativa. Temos em Trapattoni uma excepção. Por ter sido um treinador que não conseguiu criar empatia com os adeptos (foi até bastante mais vaiado que Fernando Santos), virou-se pró-activamente para a moralização dos seus jogadores. Não eram raras as situações em que elogiava de forma peremptória os seus jogadores. Lembro-me de dizer que Simão era um jogador de classe mundial, e de comentar o potencial de Manuel Fernandes. Defendeu a sua equipa em diversas situações, de uma forma que sempre me impressionou. Foi de resto um corte notório com o que era habitual em Camacho, que preferia queixar-se dos jogadores que não tinha. Trapattoni conseguiu o paradoxo de ser campeão e de mesmo assim a grande maioria dos adeptos ficar satisfeita quando abandonou a equipa campeão. A “velha raposa” deixa-me saudades, mas teve o apoio de Veiga (e que importante nos apercebemos agora que era) e da equipa, e apesar das limitações, teve condições de trabalho para preparar a equipa. Fernando Santos com um plantel melhor é certo, mas sem o desnorte da equipas adversárias de que Trapattoni beneficiou, não teve o apoio de um director desportivo, e foi deixado sózinho. Koeman teve o apoio interno e externo, tinha plantel e todas as condições, e sem ser na Liga dos Campeões, não fez melhor que Fernando Santos a nível interno. Mas os adeptos, talvez por ser estrangeiro, davam-lhe a latitude para tomar uma série de decisões que imagino serem inadmissíveis com Fernando Santos – nunca tinha visto o Benfica jogar com 4 centrais, 2 laterais e 2 trincos...
Não me lembro na era moderna de um treinador ter tido tantos “handicaps” como aqueles que Fernando Santos permitiu à direcção do Benfica. A vinda de Camacho é uma boa notícia nesse aspecto, certamente não permitirá a Luís Filipe Vieira o que Fernando Santos permitiu. Fernando Santos preparou uma época sem Simão e ele ficou, e preparou uma época com Simão e ele saiu. Não foi somente com as transferências de Simão e Manuel Fernandes que o Benfica se viu fragilizado para desnorte do treinador. A meio da época passada, quando o campeonato estava relançado e o Benfica queria recuperar e parecia a equipa mais forte, Luís Filipe Vieira, apesar de falar ambiciosamente, feriu a equipa de morte ao vender jogadores que seriam importantes. Alem dos imponderáveis, do caso Nuno Assis, e das lesões de Rui Costa e Luisão, o Presidente do Benfica vendeu Ricardo Rocha que estava a rubricar excelentes exibições, deixou sair Alcides que constituía alternativa à direita (com Nélson a rubricar exibições medíocres) e ao centro, e vendeu ainda Kikin Fonseca, avançado que sem ser um grande craque, era o único avançado do Benfica que tinha aquelas características. Em troca vieram David Luís, que não estava ainda preparado para se afirmar, e Derlei em forma deficitária (que veio treinar para o Benfica e receber um grande ordenado, para agora ser um importante jogador no Sporting). Luís Filipe Vieira falava em maiores ambições, mas os seus actos eram completamente antagónicos.
No inicio desta época e sem esperar Fernando Santos ficou sem Simão, e os jogadores que vieram colmatar a sua saída foram Di Maria lesionado, Adu que tem grande potencial futebolístico e comercial, mas tem um período de adaptação necessário para quem vem da liga americana para a Europa, e ainda Diaz que Fernando Santos nem pretendia no plantel. Quando o Benfica precisava de um jogador que entrasse na equipa de caras Luís Filipe Vieira apostou em craques lesionados, jogadores com adaptação que se adivinha longa, e um jogador vulgar. Quando Fernando Santos aproveitava aquele que tinha sido o seu melhor jogador da pré-época Manuel Fernandes, este sai supostamente para o Everton, um dia antes do jogo da 3ª pré-eliminatória quando estava inclusive convocado. Não se pode impedir um jogador de sair quando a cláusula de rescisão é accionada, mas como é possível não haver no Benfica um director desportivo capaz e informado do estado de espírito e das intenções dos jogadores? Ninguém no Benfica conseguiu antecipar que depois das boas exibições em Inglaterra e no Europeu de Sub-21, o Manuel Fernandes não estaria blindado com uma cláusula de 9M€ por 50% do seu passe. Numa situação semelhante Pinto da Costa segurou Lucho.
Fernando Santos teve uma passagem cinzenta pelo Benfica, apenas assim se pode classificar quando um treinador não ganha nenhuma competição oficial. Mas apenas lhe consigo fazer duas críticas durante o tempo que esteve no Benfica: o sistema de jogo que tentou implementar, e a falta de habilidade para tentar ganhar empatia com os adeptos. O “4x4x2 Losango” definitivamente não é sistema para um grande. O Benfica tem de jogar ao ataque de forma atraente, e a melhor maneira de o fazer é com extremos e football aberto. No sistema de Fernando Santos pesavam muito as preocupações do “processo defensivo”, a equipa nunca se queria desequilibrar cá atrás. Foi quanto a mim um erro de “casting” porque a maior parte dos jogos do Benfica em Portugal são contra equipas substancialmente mais fracas, onde o equilíbrio do meio campo não é tão importante como os desequilíbrios obtidos no último terço de terreno.
Quando o Benfica começou a ganhar jogos, e a praticar um football bastante atraente o ano passado, era a altura certa para Fernando Santos ganhar empatia com os adeptos. Ele próprio já o referiu. Não teve ajuda é certo, mas também não teve habilidade para tal. Infelizmente não é um grande comunicador, é pouco empolgante, e nas alturas cruciais em que podia ter reunido apoio dos adeptos foi muito “cinzentão”. É um problema de resto de muitos treinadores Portugueses, Jesualdo Ferreira é campeão, mas também não consegue reunir o consenso dos adeptos do F.C.Porto. No extremo da incompetência de comunicação está José Peseiro e a sua auto-vitimização.
Os pontos positivos da passagem de Fernando Santos, foram que o Benfica a espaços, praticava um football mais atractivo que qualquer outra equipa em Portugal. Muitas vezes teve coragem de arriscar, quando empatado em casa por mais que uma vez sacrificou um defesa. Alinhavam geralmente os melhores jogadores, sem haver insistência naquele jogador especifico que ninguém sabe porque joga, e que sucede com quase todos os treinadores. No segundo terço do campeonato quando o Benfica teve os jogadores todos disponíveis, fomos efectivamente a equipa mais forte na Liga. E era sua intenção, apesar do sistema táctico inapropriado, que o Benfica joga-se um football de ataque.
Fernando Santos ao contrário do que afirmou na entrevista do Trio D’Ataque foi muito inocente quando disse: “Seria um pesadelo perder Simão!”. Por via das dúvidas deveria ter pensado em ser mais optimista, e se queria elogiar Simão e mostrar-lhe a sua importância poderia ter dito que Simão era importantíssimo na equipa. O recado era dado à mesma, sem pessimismos, e duma forma que não teria direito à resposta surreal e iludida de Luís Filipe Vieira. De resto nessa mesma entrevista, e ainda com a rescisão de contrato a quente, foi inteligente, sério, e teve muita classe! Sem se inibir a dizer a sua opinião, saiu com muito nível, e devo concordar com tudo o que ali disse. Se outro treinador fosse muito teria a dizer da sua anterior entidade patronal. Com muitos menos punhais cravados nas costas vi José Peseiro achincalhar a direcção do Sporting na altura em que foi demitido.
Foi visivelmente emocionado que respondeu, quando no Trio D’Ataque, lhe perguntaram se ainda era do Benfica. E quem viu não pode ter deixado de ficar impressionado como eu fiquei. Gostei quando recentemente Rui Costa com a classe que lhe é reconhecida disse: "Não gosto muito de falar do passado até porque me parece injusto para quem esteve connosco. Fernando Santos esteve no início da época e fez tudo para que a equipa andasse. Infelizmente, não conseguimos bons resultados. Alguém tinha de pagar e acabou por ser ele a sair.". De resto já tinha gostado da intervenção de Nuno Gomes no “flash interview” no final do jogo com o Leixões, ainda antes da demissão do treinador, colocou o dedo na ferida aberta pelo presidente do Benfica, ao pedir tranquilidade para toda a equipa. Luís Filipe Vieira devia ter enfiado a carapuça em silêncio em vez de criar mais um caso de guerrilha interna. Nuno Gomes disse o que disse, como capitão, e com a legitimidade que lhe competia, e porque era importante os adeptos saberem como os jogadores se sentiam na altura.
Para o Presidente do Benfica alguém tinha de pagar, e ele o principal responsável, decidiu que seria Fernando Santos. É complicada a vida de treinador, porque em geral é sempre o elemento responsabilizado pelos insucessos que são de todos. Torço sinceramente para que Camacho seja campeão, por mérito próprio, mas com alguns jogadores escolhidos por Fernando Santos. Se Camacho for campeão, Fernando Santos será quanto a mim mais campeão que o Presidente do Benfica Luís Filipe Vieira!
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